Uma campanha de vacinação contra a poliomielite na Guiné-Bissau responde a um ressurgimento de casos
O cuidado responsável é a razão pela qual os pais param a sua colheita de caju para vacinar os seus filhos contra a poliomielite
A Guiné-Bissau foi certificada como livre de poliomielite entre 1998 e 2021, não tendo sido registados casos de pólio durante mais de 20 anos. No entanto, quatro casos de poliomielite foram confirmados na região de Bissau e Biombo, na capital, em Outubro de 2021. Além disso, foram registados casos de poliomielite em países vizinhos, nomeadamente Guiné-Conacri, Senegal e Gâmbia, em 2019. Em resposta, o Ministério da Saúde Pública, com o apoio técnico e financeiro do UNICEF, OMS e outros parceiros da Iniciativa Global de Erradicação da Pólio (GPEI), que visa assegurar que nenhuma criança seja novamente paralisada devido a qualquer poliovírus, realizou entre 27-30 de Abril de 2022, a primeira ronda da campanha integrada de vacinação contra a poliomielite, Vitamina A e Mebendazol em todas as regiões do país, sob o lema: "PÓLIO NUNCA MAIS". A segunda ronda está prevista para Junho de 2022.
Para a operacionalização desta campanha, 677 equipas de vacinação, como a liderada pela enfermeira Tamara Sá, em Bubaque, com um total de 3,385 pessoas, foram de porta em porta em todas as comunidades, aldeias e bairros, com o objetivo de vacinar mais de 340,381 crianças com menos de cinco anos contra a poliomielite na primeira ronda desta campanha, que incluiu também a administração de Vitamina A e desparasitação com Mebendazol.
"Como enfermeira, tive de contribuir para evitar a propagação da poliomielite, uma doença que não verificávamos no país há muito tempo", disse Tamara. "Contudo, a saúde dos nossos filhos é da responsabilidade de todos, não só das mães, mas também dos pais, como sinal de uma prestação de cuidados responsável", concluiu Tamara.
Uma vez vacinadas, as equipas de vacinação marcaram os dedos das crianças com tinta azul, a fim de as identificar como sendo vacinadas. Além disso, depois de terem assegurado que todas as crianças do agregado familiar foram vacinadas, as equipas registaram a vacinação na porta, destacando quantas crianças estavam presentes.
No arquipélago dos Bijagós onde Tamara trabalha, o qual é um grupo de 88 ilhas e ilhotas (cerca de 20 habitadas), espalhadas por 2,500 quilómetros quadrados do Atlântico ao largo da costa da Guiné-Bissau, incluindo Bubaque, 26 equipas de vacinação, percorreram longas distâncias para se certificarem de que todas as crianças seriam vacinadas. Apesar de ter uma população relativamente pequena, o arquipélago de Bijagós requer uma logística significativa para tal campanha, não só para viagens dentro das ilhas, mas também, entre ilhas, devido à falta de transporte (barcos, carros, motorizadas). Além disso, as ilhas de Bijagós são conhecidas pelo movimento frequente de pessoas entre as ilhas e para a capital, Bissau. No entanto, a identificação das famílias visadas foi bem feita pelos Agentes de Saúde Comunitária (ASCs). Em resposta ao movimento constante de pessoas, as equipas de saúde nas diferentes ilhas mantiveram-se em contacto frequente, informando-se mutuamente sobre a ausência de crianças. Há relatos de equipas de vacinação empenhadas que viajaram de barco durante horas para vacinar uma única criança numa ilha remota, ou equipas que viajaram com muito pouco combustível no barco, arriscando as suas vidas para garantir que cada criança seria vacinada.
Devido à época de colheita do caju em curso na Guiné-Bissau, foram verificadas situações em que as equipas de vacinação tiveram dificuldade de chegar a algumas crianças porque foram levadas para as hortas de castanhas de caju pelos seus pais. Mas isto não as impede de serem campeãs do bem-estar das crianças da Guiné-Bissau, procurando crianças nas zonas mais difíceis de alcançar e contactando os pais e cuidadores por telemóvel, encaminhando-as para os locais de vacinação mais próximos.
Num sábado de sol, a Tamara e a sua equipa de vacinação estavam a administrar as vacinas contra a poliomielite em Bubaque quando receberam a informação de que Auzenda Cardoso estava a trabalhar na sua horta de castanhas de caju, levando consigo Sandrinho Jaime Aladge (com 3 anos de idade). Após conversarem com a sua vizinha, puderam contactá-la através do telemóvel e encaminhá-la para o local de vacinação mais próximo estabelecido na Direção Regional de Saúde para estas situações específicas.
A Auzenda Cardoso e o seu marido, Jaime Aladge, têm três hortas de castanhas de caju em Bubaque, nas quais trabalham. Graças às receitas das vendas, podem comprar alimentos básicos, tais como o arroz, pagar a educação dos seus filhos, comprar medicamentos e roupas. No entanto, assim que soube que a equipa de vacinação seria capaz de vacinar o seu filho contra a poliomielite, parou imediatamente o seu trabalho para caminhar rapidamente cerca de 5 Kms com o seu filho às costas, fazendo tudo o que estava ao seu alcance para assegurar que o seu filhinho seria protegido contra a poliomielite e outras doenças evitáveis.
A colheita do caju é a principal atividade económica para as famílias Guineenses. A produção de caju na Guiné-Bissau é realizada manualmente, e o esforço para aumentar a produtividade só ocorre através da expansão da área agrícola utilizada para o cultivo do caju. Uma quantidade limitada do caju colhido é processada, principalmente para consumo doméstico: a fruta de caju é transformada em vinho e a castanha de caju é torrada e descascada. No entanto, a grande maioria da produção de castanha de caju é direcionada para a exportação da amêndoa do caju em bruto.
A campanha do caju é fundamental para a economia da Guiné-Bissau porque é a principal fonte de rendimento dos agricultores da Guiné-Bissau e também providencia uma grande contribuição para o Produto Interno Bruto (PIB) do país. Dados da Aliança Africana do Caju indicam a Guiné-Bissau como o segundo maior produtor do contingente, depois da Costa do Marfim, contribuindo com cerca de 8% das castanhas produzidas no mundo.
"A saúde das nossas crianças é a coisa mais importante do mundo", disse Auzenda. "Foi por isso que corri para chegar ao local de vacinação que foi gentilmente indicado pelos vacinadores, eles são uma bênção", concluiu ela.
Em apoio a esta campanha, o UNICEF ajudou a Guiné-Bissau nas seguintes áreas:
• Compra de 907,500 doses das vacinas pólio assim como a assegurar a necessária cadeia de frio através da aquisição de 5 frigoríficos para conservação das vacinas de forma a fazer face a carências existente nas regiões;
• Apoiou a distribuição das vacinas e materiais/equipamentos de campanha para as regiões, assim como, fundos para as equipas de logística, monitores de frasco e mobilização social;
• Mobilizou líderes religiosos e tradicionais, jovens, associações de mulheres, estudantes, professores, pais e prestadores de cuidados, meios de comunicação e inúmeros influenciadores locais, promovendo o seu engajamento ativo na realização da campanha pólio.
Espera-se que a campanha contra a poliomielite na Guiné Bissau ponha fim ao ressurgimento de casos de poliomielite. Está a ser apoiada pela Iniciativa Global de Erradicação da Pólio, a qual é uma parceria público-privada liderada por governos nacionais com seis parceiros principais - a Organização Mundial de Saúde (OMS), Rotary International, o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Fundação Bill & Melinda Gates e GAVI, a Aliança de Vacinas. O seu objetivo é erradicar a poliomielite em todo o mundo.